Sunday, September 17, 2006

SILVIA CHUEIRE - Poeta (entrevista)

PEQUENA SOCIEDADE DAS POETAS VIVAS- IV -SILVIA CHUEIRE

Sivia Chueire, Médica, Poetisa

O Sub Rosa tem o orgulho e a pretensão de apresentar, 'duas ou três coisas que sei', que tenho sentido, descoberto, e intuído a respeito da conhecida poetisa carioca Silvia Nogueira da Gama Chueire.
Não podemos nos deter em mais nada. Tudo o que você queria e precisava de saber sobre ela está aqui, em primeira mão, para os meus queridos leitores:-)
*Mulher bonitíssima. *Inteligente. *Estimulante. *Sensível. *Culta. *Médica. *Psiquiatra com formação psicanalítica. *Cronista. *Blogger. *Poetisa.
*Um livro: Por favor, um blues, que a Editora Cosmorama, em 2005, publicou em Coimbra,, na cidade do Porto, Portugal.(*)
(e que o Sub Rosa noticiou em primeríssima mão, no Brasil;-) pisc* )
Não queiram ver gradações nesta sucinta apresentação. Importa saber que há vários meses começamos a conversar acerca de eu publicar um texto de Sílvia, o que ela pronta e delicadamente aceitou. As conversas, trocas de email, evoluíram e eis o resultado: esta entrevista (informalíssima) que fiz e que, creio, imodestamente ( 'o que é isso, a modéstia', anyway?) expõe e dá uma pequena mostra do sólido conhecimento de Sílvia em questões como a Filosofia, Poesia, Psicologia, Psicanálise, Medicina, é claro, e mais a observação da vida, além da imensa sensibilidade e imaginação, o que deve lhe dar e aumentar a força criativa; que cabe agora a vocês conhecer e julgar. Comentar e discutir.
;-)

Pequena antologia:

oferenda

ofereço-te meu corpo
faz dele o que quiseres
é o teu desejo
que desejo.
----------------------------------------------
preferir

à lâmina das palavras
preferir a chama,
a boca irisada,
a língua.

palavras que soletram
lentamente o ato.
-----------------------------------------------
mar

cola a tua boca
no mar que sou
o sal e as ondas

derramadas.

ouves o marulhar
na respiração ritmada
que cresce
e desliza na praia?

às vezes é tudo tão azul
que ofusca
------------------------------------------------
quereis muito

quereis a palavra certa
na hora certa.
não apenas o metro correto,
a frase bem feita.
quereis o sangue,
a alma do poeta,
a vida curta a galopar
gargantas

– como se não custasse esforço
fingir que fingimos –

quereis a vida,
a árvore da vida.
não apenas o trajeto reto,
geometria exata.
quereis elipses, parábolas,
o sabor mais íntimo
a perpassar vocábulos.

– como se cada letra
não fosse gota derramada –

quereis o que não sei
se posso dar.
o segredo do olhar,
o frio que me corta a pele
antes que a palavra
se esfacele e arda
na fina folha
de cada momento.

– como se cada volta da caneta
não fosse hesitação –

quereis muito, senhores,
muito.
mais do que pode
a mão que escreve o poema.
mais do que pode
um simples coração.

Do seu livro: Por favor, um blues.
***
Da série ÁRABES
Árabes V


Sob as estrelas

Antes que tivéssemos bandeira e hino
tínhamos a pátria sob as estrelas.

O cedro erguido
na imponência da noite.
----------------------------------------------
Árabes – XX
Dás-me

Dás-me um coração vazio,
o deserto do Saara
a dançar nas minhas mãos.
A secura do olhar misturada
à areia áspera trazida pelo vento
-----------------
Árabes - XXIII

Dançar

Dancei para ti.
A percussão , as guitarras
a arrancarem-me do ventre,
das ancas, em ondas,
o que queria dar-te.

Dancei para ti sob a lua do deserto
- todos os homens sabiam.
A fogueira acendida nos olhos,
a noite a arder entre almofadas.

Hoje é esta angústia,
a areia a lavar-me os olhos,
a tua ausência a ferir-me a pele.

Silvia Chueire





ENTREVISTA COM SILVIA CHUEIRE

*- Silvia, sei, porque me interessei pela sua escrita e porque sou mesmo atrevida (risos) que você começou a escrever um pouco mais tarde - ou seja, graças aos deuses, você não escreve *desde que se entende por gente* - como é comum as pessoas as pessoas responderem.
Como se deu o aparecimento da escrita literária e em especial da Poesia em sua vida?


Somos duas atrevidas, então. Sorrio aqui.
Nunca escrevi. Isto é, ao longo da vida eu escrevia coisas, mas elas nada tinham a ver com poesia ou literatura. Eram por assim dizer, desabafos. Sempre soube que havia algo a dizer neste sentido. Afinal, criança ainda tive uma primeira aproximação com a poesia que me marcou muitíssimo. E livros de todos os tipos que me caíssem nas mãos eram vorazmente lidos. Apenas a vontade de escrever não me fazia escrever bem. Faltava algo, eu não sabia o que era. E raras pessoas gostavam de, ou conheciam poesia . O tempo passou e o que fiz foi escrever pouco e mal. De modo que fiz muitas tentativas sem sucesso. Sucesso no sentido de exprimir o que pensava ou sentia de modo a que ali houvesse música e uma escrita que não fosse a pobreza mais pobre do lugar comum, um texto que eu reconhecesse como ao menos razoável. Depois filhos, muito trabalho, textos específicos para ler e escrever e uma vida corrida, me afastaram um tanto dos livros. Mais tarde, as crianças maiores, voltei a ler com frequência. Um dia escrevi um poema que me agradou. Não era bom, talvez nem mediano. Mas pensei comigo : ora, e não é que este não está tão ruim ? Como se eu tivesse encontrado uma trilha tosca no matagal. E foi assim. Daí em diante comecei a ler mais poesia - descobri um mundo que mal conhecia – e a escrever com maior regularidade. A participar de uma lista de discussão sobre poesia e me obrigar a ter um compromisso regular. Depois o blog, e sempre mais poemas. E aqui estamos
.


* Silvia, o título de seu blog é muito poético: In the meadow.
Fale tudo sobre Eugênia Fortes. Tudo que a gente queria saber e não sabe.;-)
Que agora não consta mais do título do blog. (só do endereço)


A Eugênia Fortes foi - e você vai achar isto uma bobagem, porque eu podia ter uma razão mais romântica, mais dramática e não tinha - apenas uma tentativa de, usando um pseudônimo escrever mais livremente. Era afinal a internet, um blog, e me preocupou usar meu próprio nome e sobrenome. Sendo médica e psiquiatra e além disso ignorando como os blogs efetivamente funcionavam, preocupei-me. Pura bobagem.

Foi com a Eugênia que comecei a escrever um arremedo de prosa. E nunca usei o blog como diário pessoal. Porém, quando colocava lá poemas que tinha escrito antes mantinha neles o meu nome. Já havia poemas meus em dois ou três sites, por isso mantinha o meu nome. Isto gerou nas pessoas uma confusão e eu, percebendo que as minhas preocupações não tinham razão de ser acabei por avisar no cabeçalho do blog que éramos a mesma pessoa e parar de assinar EF. Se republico algum poema que era assinado EF, agora mudo a assinatura.
O engraçado é que me dá uma certa saudade da Eugênia, tenho mesmo vontade de voltar a escrever com este nome.


* Falando em blogs: muitos escritores e até mesmo críticos, são de opinião que se por um lado a Internet e os blogues tornaram mais fácil a publicação de escritos *guardados na gaveta* (na expressão feliz de Clarice Lispector e José Paulo Paes), por outro, incentivaram muito uma produção de quantidade inversamente à qualidade. O que acha das Listas de Discussão, Listas de emails , de Poesia. Ajudaram você em alguma coisa?

Concordo parcialmente. O advento dos sites, dos blogs, incentiva a publicação, mas não em detrimento da qualidade. A qualidade da escrita da grande maioria é mesmo ruim. Na net a maior parte das pessoas pretende, de alguma forma, comunicar-se com outras pessoas conhecidas ou não. Não vejo nehum problema na questão da publicação. Que mal há em publicar na net o que se escreve? De qualquer forma nem todo mundo pretende escrever literatura, nem quer. Sou de opinião que nada ajuda mais a aprimorar da escrita do que ler e escrever. Todos têm o direito de escrever e publicar o que foi escrito? Ótimo ! Há então, no mínimo um exercício da escrita que não havia antes. E da leitura.
Para alguns, como eu por exemplo, os blogs, as listas são um exercício, uma disciplina, o compromisso com escrever sem a pressão para fazê-lo . São um meio de dar a conhecer o que se escreve, um meio de saber o que pensam os outros à respeito de poesia e prosa e da minha poesia e ( bem...) prosa. São um meio de debater questões relativas à escrita. Na medida que os pares gostem ou não, que se se manifestem, são um incentivo e um aprendizado com as críticas ou com o silêncio. Têm algumas desvantagens, mas no geral acho que têm valor.Last but not least são lugares de leitura. Tudo isto foi para mim importante. Afinal, eu nunca frequentei uma faculdade de Letras, portanto não tinha pares quando se tratava da poesia ou mesmo de alguma prosa. São todos uma boa contribuição principalmente quando se tem "ouvidos" atentos a ela.

* Silvia, você reconhece como legítima uma poesia "feminina", ou "poesia no feminino"... enfim, o que torna (ou não) reconhecível uma poética, ou uma dichtung feminina? (Não se trata de sexo e nem de gênero, mas de uma 'categoria': a da diferença)

Não é uma questão de legitimidade, penso. Basicamente entendo escrever poesia (ou prosa) como algo que é exercido, construído, sempre a partir do olhar do poeta para o mundo . Mesmo quando há heterônimos, mesmo quando o poema é uma construção, por assim dizer, racional, mesmo quando é pura ficção. A pura ficção é inventada por um sujeito. E quando será possível descolar o sujeito da sua escrita? Nunca. Ainda que ele invente será sempre seu o olhar inventor. De modo que, claro, quando uma mulher escreve ela terá na sua escrita questões, olhares, femininos. O mesmo vale para uma pessoa idosa ou para um homem, etc, etc. Isto faz uma diferença num certo sentimento de mundo? Claro. Mas não o faz cada escrita pessoal na sua individualidade? Esta mesma mulher terá questões, pensamentos, que são as de todos nós, homens e mulheres. A boa literatura produzida pelas pessoas tem um valor que transcende o gênero ao qual elas pertençam. Reconheço os poetas que escrevem como se fossem mulheres e mulheres que escrevem como se fossem homens. Quanto mais convincentes forem mais estão a nos dizer da sua sensibilidade em relação ao olhar alheio, à empatia, ao colocar-se no lugar de. Ainda assim não são o outro. Considero bastante interessante examinar, analisar o olhar de determinada autora no que ela tem de feminino, rebelde, ou o que seja e estudá-lo na sua expressão escrita como você fez ao estudar as fases do Bandeira, por exemplo. Mas categorizá-lo como uma dischtung ou poética feminina não faz o menor sentido. A Literatura, a Poesia são maiores do que estas diferenças. Habitam um universo sem gêneros. Por outro lado:
Por que seria Literatura Feminina a produzida por mulheres e Literatura a produzida pelos homens?





* Paraty, nome mágico, a FLIP, já está incorporado ao Calendário de acontecimentos literários do Brasil e de alguns países do mundo. Pois bem, essa minha afirmação é exagerada? Que pensa da FLIP em relação a escritores em geral?

Nenhum exagero na sua afirmação, Meg.
Paraty, a FLIP, é mesmo uma festa literária. As pessoas literalmente ( se me perdoa o trocadilho) festejam. Conversa-se animadamente sobre livros, textos, poesia, sobre a escrita de fulano ou sicrano. Pessoas ainda jovens falando sobre literatura. Isso dá um alento na gente ! À noite come-se e bebe-se, vai-se a shows, dança-se e conversa-se mais. Durante o dia assiste-se as mesas que são sempre em tom de entrevista, informais, nada acadêmicas, o que é interessante, agradável e suscita questões. Há sempre a oportunidade de fazermos as perguntas aos autores que quisermos . Autores que nunca pensaríamos poder encontrar porque vêm de toda parte do mundo. Poucos, mas bons na sua maioria. E sempre há ao menos uma oficina literária.

Há um espaço de peso para a poesia. Menor é claro - porque este evento é editorial também - do que para a prosa. Mas há. E com uma divulgação de porte que nunca houve. Maior mesmo do que as Bienais, que são no geral apenas grandes feiras de livros.

Essa festa tem intenções para além de ser uma festa. É um grande evento turístico e de marketing. Bancado por poucas editoras que dão principalmente aos seus autores o destaque que é necessário para a venda dos seus livros.
Portanto, a FLIP tem os seus limites. Nem por isso deixa de ser um evento agradável e interessante. Nem por isso deixa de ser um lugar onde os escritores se encontram entre si, e se encontram também com seus leitores. Uma fatia considerável deles se pensarmos nos resultados depois da FLIP e da enorme divulgação pela mídia.
Assim, veja você, minha empregada quando voltei da últma FLIP sabia coisas - e me perguntou por elas- que nunca ouvira antes.
Eu fui três vezes à FLIP, encantada na primeira retornei, e este ano vou novamente. Desta vez ao que parece vou ler uns poemas meus num evento da OFF FLIP, este evento paralelo que também vem crescendo e se tornando cada vez mais um espaço alternativo de boa qualidade
.

**O que você acha do mercado editorial (para poetas mulheres) - direi poetisas?
(Veja: não se tratará da *questão mercado editorial*, quero que diga que chances, poetas homens ou poetas mulheres - poetisas, você, por exemplo, teriam de ver seu livro publicado no Brasil - creio que é fácil entender por que pergunto isso)


Minha opinião se aplica tanto aos homens quanto às mulheres que escrevem poemas, penso que o mercado atualmente não distingue por sexo. Acho que as chances são mais do que mínimas, microscópicas mesmo. Poesia no Brasil é pouquíssimo editada, e quando o fazem são em geral os poetas conhecidos, consagrados. Sim, há as exceções. As que tenho visto são ou nomes de artistas conhecidas de TV, sejam eles (elas) bons ou maus escritores de poemas. E há as (perdoe-me a redundância) exceções excepcionais, algumas editoras que corajosamente se atrevem a publicar poetas talentosos que vão surgindo, mesmo que eles não dêem lucro algum. Ouso dizer, eu que nunca pesquisei sobre o assunto, que deve haver excelentes poetas que nunca conheceremos. Então, num certo sentido, há para alguns além da competência, do talento, alguma sorte e muito trabalho para darem-se a conhecer. Do mesmo modo que temos provavelmente centenas (ou mais) de edições do autor das quais nunca ouvimos nem ouviremos falar.


*Diga aqui só entre nós duas;-) e os leitores do Sub Rosa: existe possibilidade de o seu livro ser publicado no Brasil?

Não sei, talvez exista alguma, ínfima, mas intimamente creio que não.

*Bem, então como você analisa o fato de o seu livro ser publicado primeiro em Portugal ...

Não sei bem como analisar, mas vou novamente ser atrevida : penso que os portugueses em geral dão mais importância para ler, escrever e publicar) à poesia do que nós, se compararmos as proporções. Ainda que eles se critiquem e achem pouco. Então nesta situação eu tive alguma sorte, claro. Alguém leu o meu blog e o levou impresso a um jovem editor que mal começava a sua editora. Este alguém , agora é grande amigo meu. Pois bem, este editor, que se chama José Rui Teixeira gostou dos meus poemas e decidiu - apesar de estar apenas começando, veja bem ! - publicá-los. Comunicou-me, pediu que eu selecionasse os poemas e um ano e alguns meses depois o livro estava publicado .
Um editor decidido a iniciar uma editora que vem crescendo ao longo dos seus dois anos a olhos vistos, a Cosmorama. E ele merece, trabalha muito e com afinco. Você a encontra na net em :
http://aparicoes.blogspot.com .

*... os brasileiros teriam deixado passar uma oportunidade que foi mais bem compreendida por ou em Portugal?
No Brasil seria muito menos provável a minha sorte, digamos. Temos tanta gente boa, jovem ainda, escrevendo. Eu não faço nada para publicar os meus poemas, afora ter um blog. Digo, nunca fui a uma editora, e não iria. Acho tão pouco provável, que nunca tinha pensado em publicar, se eventualmente o fiz meu pensamento constrangeu-me . Tanta gente boa não é publicada, gente melhor que eu...

*Você diz sempre que leu muita poesia portuguesa, mas quanto à brasileira? Acompanha o panorama da poesia contemporânea brasileira?

Muita talvez para uma brasileira. O que costumo dizer é que não sendo literata, nem trabalhando na área literária, penso ter lido mais os portugueses do que a maioria dos brasileiros que conheço, que gostam de literatura e que lêem poesia.
Não acompanho o panorama da poesia brasileira contemporânea. O que faço é ir às livrarias, olhar os livros de poemas que lá estão , sentar-me e lê-los a ver se gosto deles e comprá-los sempre que gosto. Tenho tido ótimas surpresas com nomes que não conhecia. Eventualmente leio sobre eles em algum caderno literário dos jornais. Se quero mais e não encontro, procuro na internet. E tenho encontrado muita gente boa na e pela internet. De forma que não tenho exatamente a idéia geral que o conhecimento do panorama exigiria.


** O que acha da associação ainda hoje corrente entre o Poeta e a angústia, o sofrimento? A vida atribulada concorre para uma depuração da criação? (pergunto isso - também- porque como os leitores do Sub Rosa estão vendo, Silvia Chueire é uma mulher muito bonita, e alegria parece ser a palavra de ordem oriunda de seu sorriso)

Acho que isto é um mito que está , como você mesma diz, se desfazendo. Levo em consideração que há que haver alguma ansiedade a nos empurrar para a criação, para mover-nos. Pessoas num estado de apatia, de extrema beatitude escrevem menos, assim como as extremamente deprimidas ou em pleno surto delirante. E admito que as pessoas que sofrem possam estar em determinado momento mais permeáveis à coisa criativa. Não o estão também as pessoas felizes ? Não vejo uma relação direta entre a angústia e a escrita, poética ou não. Parece-me que esta visão do poeta como alguém que é sensível e escreve porque sofre, é uma visão romântica. O amor talvez tenha esta relação mais clara com os poemas. A idealização em torno do poeta é outro mito. Não tenho dos poetas, dos escritores, uma visão especial. Sei bem que o leitor pode encantar-se com o texto ou o poema e, a partir disto, idealizar o autor. Pessoas comuns, os poetas. Passam pelas mesmas vicissitudes de todas as outras. Apenas têm o talento de, ao olhar o mundo descobrir a poesia das coisas e as traduzir em palavras. Pessoas sensíveis, dizem. Talvez o sejam, mas de uma sensibilidade específica, que cria. Conheci pessoas sensíveis que nunca escreveram uma só linha. E poetas que eram criaturas bastante insensíveis.

silvia e seu sorriso

*Em recente e brilhante Conferência proferida pelo sábio brasileiro -reconhecido em praticamente todo o mundo ocidental - Professor BENEDITO NUNES , no Teatro Maria Sylvia Nunes, em Belém do Pará, intitulada GÊNIO, MANIA E FOLIA - ele lembrou a distinção de FERNANDO PESSOA entre os loucos a quente e os doidos a frio e ele, Pessoa, o grande Poeta, foi julgado por si mesmo como incluído nesta última categoria - 'doido a frio, doido de verdade'.
Também lembrou Kant que na primeira parte da Crítica do Juízo, (na Estética) focaliza o gênio (tem gênio - como talento específico -aquele que cria dando à sua obra o vulto do penetrante conhecimento das coisas, livre do constrangimento das regras e acima da tradição a que está vinculado.
Dessa forma, o gênio é um *maniaco*, ou seja um 'delirante', no sentido grego. O que está explicitado no FEDRO, por Platão.
Mas onde eu quero chegar é: você como médica especializada, ou especialista, como vê essa relação entre gênio, loucura e criação?

Olha, Meg: não creio que Kant se referisse ao louco quando pensava o gênio. Penso que falava do gênio como o homem que teria a faculdade de perceber a beleza das coisas, do mundo, a partir de uma disposição pessoal, única, e do talento natural para criar uma obra de arte para a qual antes não havia regras. Um homem que parte da ausência de regras, cria sua obra na ausência delas e não segue padrões. Está acima, ou melhor fora deles. Sua obra, no entanto, será reconhecida pelos outros que verão nela regras a serem seguidas. Tem a marca de uma originalidade absoluta. Sem isto não haveria genialidade.

Tenho clareza que a condição de gênio não é algo da ordem da loucura. Ainda que a cultura ocidental tenha criado esta espécie de mito ( aí também) à medida que identificou comportamentos excêntricos de alguns e mesmo a loucura de outros, com a genialidade de poucos. Um gênio (um criador) pode ficar angustiado, pode mesmo enlouquecer, mas isto não signfica que há uma relação direta da sua genialidade com a sua loucura, o mesmo vale para o poeta ou o escritor geniais. Estou falando da loucura de fato. Digo, da loucura não romancizada. Em Platão, o que me parece é que o "daimon"- gênio era um intermediador entre homens e deuses. O gênio de Kant é também uma espécie de intermediador entre os homens e a beleza do mundo.

Em Fedro Platão diz algumas coisas distintas: fala do apaixonado como um louco, um delirante que não se deve temer porque é inspirado pelos deuses para sua (dele ou de ambos os amantes) felicidade. Diz ainda que a loucura não é um mal e dá origem a três tipos de delírio também inspirados pelos deuses: "maniké" -mania, o nome dado à arte de prever o futuro sob inspiração divina; aquele que surge durante catástrofes e aponta o dom de descobrir remédios e males e preces que afastem a ira dos deuses; e o provocado pelas três musas, delírio que inspira odes e poemas. Em todos eles a divindade tem uma participação direta. Daí, penso, a idéia do poeta como um homem “especial”, ainda hoje entendido como um ser diferente dos outros .

Estas aproximações do conceito atual de loucura, mania e delírio são interessantes porque apesar de não serem em nada os mesmos conceitos são uma espécie de metáfora da loucura.

Falo aqui da loucura que impede o sujeito de escrever, de pintar, de viver, enfim. Porque desorganiza aos seus pensamentos, provoca alucinações, cria gaps no seu estar interior e no seu estar no mundo.

*Silvia, se fosse o caso, poderia dizer (cruelmente, até para que eu o mudasse) o que pensa do título desta série na qual você está incluída: "PEQUENA SOCIEDADE DAS GRANDES POETAS VIVAS"?

Ah, Meg, acho o título fantástico ! E pode parecer falsa modéstia, mas não é, garanto ; não acho que eu mereça pertencer a esta sociedade.

* Que poetisas brasileiras e portuguesas vivas você indicaria?

Brasileiras : Adélia Prado, Claudia Roquette Pinto, Virna Teixeira, Neide Archanjo.
Portuguesas : Maria Tereza Horta, Luísa Neto Jorge, Ana Luísa Amaral.


* Claro que todos sabem que um poema não cai no colo do autor, poderia descrever o seu processo de criação?

Escrevo a partir de tantas coisas, Meg. Por tantas razões e por nenhuma. Assim, um pensamento ou o fragmento dele, uma canção, a emoção despertada pela natureza e seus fenômenos quando ela se apresenta a mim ou quando eu tenho olhos para ver. Outro poema, ou prosa, pode me despertar a vontade de escrever algo. Alguma provocação que eventualmente eu (ou os outros) me faça : escrever algo que não sinto, que não vivi, alguma coisa apenas racional. Minha própria vida, acontecimentos,observações,reflexões, entrelaço-os com ficção.
Em geral anoto num pedaço qualquer de papel, ou no computador. Às vezes os poemas me vêm à cabeça quase prontos, noutras eu os trabalho mais, ou espero que se desenrole de mim o que quero escrever. O fato é que se não anotar eu os perco completamente. Já me aconteceu, e com frases que lamentei depois não lembrar. Antes de publicar eu os revejo muitas vezes e este é um trabalho que me parece nunca terminar. Sempre fico com a sensação de que isto e aquilo poderiam ser mudados para melhor .
Não escrevo poemas perfeitos.


*********
* Bem, Silvia, para os limites de um blogue, chegamos ao final dessa mini-entrevista - que como você sabe e os leitores ficam sabendo, foi a mais informal possível (gente, conversar com a Sílvia é um barato total;-):-) Ela é muito estimulante, a prosa corre solta). Os emails voam:-)
No entanto, como faço com todos os meus entrevistados, pergunto:
O que gostaria de acrescentar? Que pergunta eu deveria ter feito e não fiz?

Nada a acrescentar, as perguntas foram bem feitas.

*Nesse caso,Silvia, muito obrigada. Iimensamente. Por enriquecer o Sub Rosa, a mim e a todos os nossos privilegiadíssimos (13 ou 14) leitores), que tenho a certeza, agradecem comigo, o fato de ter atendido o meu pedido de entrevista, sem delongas, e com muita simpatia, educação e boa-vontade. Foi um prazer e uma honra.

Não há o que agradecer , Meg. Você faz um trabalho de divulgação muitíssimo bem feito, tem um blog bem cuidado e de bom gosto. Eu é que devo dizer : Obrigada ! Para mim é um prazer estar aqui como leitora e agora como entrevistada. Eu ganho com isso. Sou-lhe grata por tudo e porque sei muito bem o trabalho danado que vc deve ter tido.

*********
Todos ganhamos, Silvia:-)
SERVIÇO:
O livro de Silvia no Sub Rosa:
http://flabbergasted.blogspot.com/2005/10/silvia-chueire.html
IN: http://flabbergasted.blogspot.com/2005_10_01_flabbergasted_archive.html

Sobre livro de Silvia Chueire aqui vai o endereço do editor a quem se pode encomendar:
"Por favor, um blues" : joseruiteixeira@netcabo.pt

E você pode encontrá-la, ler, apreciar e comentar seus poemas aqui em seu blog:
In the meadow

(*) Agradeço, sensibilizada, a correção, a acuidade e a generosidade do escritor PAULO JOSÉ MIRANDA, que me chegou por email: O livro de Silvia foi publicado em Portugal, no Porto e não em Coimbra. Obrigadíssima

1 comment:

Anonymous said...

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